sábado, 18 de outubro de 2008

Deus e César

Por Robson Wellington

"O poder do voto evangélico". Essa foi a manchete do jornal Folha Universal publicado em 28 de setembro. Em linhas gerais, a matéria ambiciona o despertamento da “consciência política”, da lembrança da existência de um “projeto divino” de formação de uma nação e da necessidade de “engajamento”. Divulgou o livro "Plano de Poder" do bispo Edir Macedo, auto-intitulado “um libelo contra a alienação e desinformação”. As aspas são todas minhas. Depois de ler o conteúdo da matéria tive a certeza de que deveria fazer alguma coisa, daí iniciei uma campanha contra o voto no candidato Marcelo Crivella para prefeitura da cidade do Rio de Janeiro.

Muito distante de concordar com Tertuliano que declarou que Jerusalém (religião) e Atenas (cultura) não possuem nada em comum e, que sendo assim os cristãos deveriam participar da vida cultural o menos possível. Tenho que expressar a minha total desaprovação da politicagem burra, suja, retrógada, corporativista e prostituta da esmagadora maioria dos políticos evangélicos no Brasil. Sou de uma das cidades de maior proporção de evangélicos do país e que há 12 anos vive uma espécie de “gospel power”. Que desastre! Desgraçadamente, sou obrigado a concordar com um amigo que coloca candidatos que se dizem evangélicos no final da sua lista de opções.

É de um profundo analfabetismo bíblico e anacronismo histórico considerar necessário para o cumprimento do eterno projeto divino a utilização do conceito e estrutura do Estado moderno. A promoção e defesa do Evangelho é tarefa unicamente da Igreja que sempre triunfou e triunfará no poder do Espírito Santo. O que passar disso é discurso forjado para tentar espiritualizar a carnal tentação pelo poder que só convence os incautos.

“Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”. Isso foi o que o Deus encarnado disse sobre nossa participação na sociedade. E não há nada que inspire o isolacionismo passivo nessa declaração. Agostinho parece ter compreendido bem expondo que o Estado e a Igreja são duas espadas, debaixo do governo de Deus, ambas servindo aos propósitos divinos, mas independentes entre si. Calvino via o engajamento político (não necessariamente partidário, mas cidadão) dos cristãos como uma “sacrossanta vocação”. Os valores dos novos céus e da nova terra “onde habita a justiça” podem e devem ser fator determinante do nosso envolvimento político e social. Nesse assunto vale a máxima: Religião e Política, sim. Igreja e Estado, não.

Creio que os cristãos devem estar engajados na vida política do país, mas não da forma que tem sido feito. Creio que embora todas as pessoas sejam naturalmente depravadas e que o pecado permeie todas as ações e instituições humanas, Deus é soberano sobre toda a atividade cultural humana. Deus está estendendo um reino sobre a terra, e os cristãos devem responder obedientemente ao mandato de Deus, e servi-lo como “sal” e “luz” em todas as áreas da vida, incluindo a política. Como cristão devo lutar para reestruturar a sociedade onde vivo, moldando-a de acordo com os padrões divinos. Lutar por leis mais santas e justas, enquanto prego todo o Evangelho para o homem todo. Porque só assim os homens estarão capacitados para obedecer essas leis.

O bispo anglicano Robinson Calvancanti coloca a coisa da seguinte forma: “O mundo nunca será perfeito antes da Nova Jerusalém, mas pode estar muito pior em razão da nossa omissão ou do nosso apoio aos mais egoístas por interesses próprios. O engajamento obediente é um sinal de santidade ativa. Há a participação docente, intercessória e profética das igrejas como instituições, a dos cristãos individuais como cidadãos e a participação orgânica dos movimentos e instituições cristãs, levando em conta a conjuntura, as estruturas, as necessidades, as possibilidades, os dons e as vocações. A ação política (cidadã) não deve se limitar ao partidário nem, muito menos, ao eleitoral, mas a uma atitude de responsabilidade, sensibilidade, disponibilidade e intervenção no cotidiano, que é obediência e testemunho”.

E esse é um grande desafio. Diante disso, muitos preferem a acomodação e escapismo, desdobradas da falácia sobre o fim do mundo, dizendo que não foram chamados para organizarem o inferno. Mas pense comigo: Porque o inferno na Somália é pior do que na Suécia? Podemos influenciar, podemos reformar, podemos melhorar. Creio que a consumação da redenção do mundo (quando todas as coisas estiverem convergidas em Cristo) ainda está por vir, mas isto não elimina a realidade processual da qual somos atores protagonistas. Devemos hoje construir uma sociedade melhor. A Igreja é a principal agência do Reino de Deus e, fazendo assim, promoverá o reino que está sob o governo do Filho de Deus.

Voltando ao Crivella... Irmão vota em irmão? Depende. Ele é verdadeiramnete irmão? Está ligado a uma instituição genuinamente cristã? Tem valores cristãos? É tão difícil responder isso de quem quer que seja, que usar esses critérios para escolher um candidado torna-se altamente questionável. Ainda que todas as respostas fossem sim, eu continuaria afirmando que dependeria. É honesto? Tem consciência e engajamento político? É coerente? É competente? Afinal de contas estou elegendo um prefeito e não um presbítero.

Continuarei me opondo a todo esse lixo de fisiologismo político que sobe e discursa em púlpitos, panfleta na porta dos templos e usa institucionalmente denominações, sempre sustentado pela alienação do ópio religioso que drogou grande parte da igreja brasileira, fixando seu olhar sobre o próprio umbigo, contribuindo para a exibição de uma tosca caricatura de cristianismo diante de uma sociedade corrompida que geme pela revelação dos filhos de Deus.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

A glória da fraqueza

Por Robson Wellington

Estou há uma semana querendo postar alguma coisa aqui, mas a verdade é que eu não tinha nada de interessante pra contar. Venci o tácito desejo de impressionar a Deus e aos irmãos desfilando com uma bonita máscara de super-crente “Vai tudo bem”. Na verdade desde que assentei no banco dos catecúmenos da igreja maltrapilha dia-a-dia procuro matar uma pouco desse impostor que de tanto dormir e acordar comigo, às vezes penso que sou eu. As coisas não vão nada bem. Estou fraco!

Eu não sou o que você pensa que sou e nem o que eu gostaria de ser. Eu não sou o que deveria ser e não faço o que deveria fazer. Como uma espécie de utopia, muito provavelmente eu nunca atinja as minhas e as suas expectativas. Pela minha capacidade, com toda a certeza eu nunca atingirei as expectativas de Deus. Mas sabe aquela história do poder de Deus se aperfeiçoando na fraqueza? Eu tenho experimentado um pouco disso. Como Paulo descobriu, eu tenho descoberto a cada dia a glória da fraqueza.

É bem verdade que ambientes adoecidos pela religiosidade tendem a rejeitar a fraqueza. Ali não se percebe essa glória. Ali fraqueza rima com exposição imprópria e desonra. A preferência é sempre pelo testemunho teatral e auto-engano. Essa preferência é justificada pelo fantasma do escândalo. Eu acho que ninguém deve sair por aí querendo escandalizar, mas também ninguém deve permitir que a nossa liberdade em Cristo seja objeto da gestão adoecida de fariseus.

A religião segue exalando o formol da salvação pelas obras e entorpecidos por esse cheiro, sobrevivemos oscilando entre o desejo de punir a nós mesmos por não nos “santificarmos” como deveríamos, por não orarmos como deveríamos, por não meditarmos na Bíblia como deveríamos, por não evangelizarmos como deveríamos e o desejo de congratular a nós mesmos pelo nosso “êxito espiritual” que produz um falso senso de segurança baseado numa certa superioridade moral, comprovada pelas nossas atitudes politicamente corretas e nossa boa reputação.

Muitas vezes, ficamos alarmados diante da nossa inconsistência, frustrados por não termos vivido à altura de nossas expectativas. Crentes iô-iô presos em um círculo vicioso de euforia e depressão. Aqui a glória da fraqueza não é percebida. Aqui não há Boa Notícia. Lutamos em vão, perdemos tempo, em vez de simplesmente reconhecermos que não somos nada diante de Deus e assim mergulhar num relacionamento profundo com Ele, relacionamento esse que não é ópio, porque não aliena, ele conscientiza, liberta e consola.

O Evangelho declara que não importa o quanto somos dedicados e devotos, não somos capazes de salvar a nós mesmos. O que Jesus fez foi, é e sempre será plenamente suficiente. Nossa total confiança passa ser justamente o fato de não termos confiança nenhuma em nós mesmos. Arriscamos tudo em Jesus! Somos libertos do medo de se admitir, do medo de se enxergar, do medo de olhar pra dentro e se perceber. A glória da fraqueza é ser convertido a arrebatadora realidade da graça de Jesus.

Essa verdade, no entanto, não é de fácil apreensão. Ela requer um destronar do eu que ele mesmo não pode fazer sozinho. Sendo assim, somente através de um milagroso golpe de estado contra o eu, resultado da revelação que ilumina o entendimento, efetuando o querer e o realizar em nós, ou através das milagrosas e determinadas quebradas de caras da vida que nos mostram o perdão sem auto-justificação é possível pacificar a nossa resistência, para uma rendição à graça.

Só assim, percebemos a tolice do esforço para obter o favor de Deus, para garantir valor próprio e da pressa competitiva para chegar na frente dos outros. A nossa falência é a Sua exaltação. Aqui descobrimos que somos apaixonadamente e incondicionalmente amados. Graça perfeitamente determinada, perfeitamente aplicada, perfeitamente apropriada para minha necessidade. Maravilhosa graça!

“Chegando a Macedônia, nenhum alívio tivemos; pelo contrário, em tudo fomos atribulados: lutas por fora, temores por dentro”. Isso foi o que Paulo disse no verso 5 do capítulo 7 da sua segunda carta aos coríntios. Pelo contexto da passagem, percebo claramente que os medos e lutas de Paulo eram bem mais sadios que os meus, mas mesmo assim, me identifico e aprendo ao vê-lo debaixo da graça de se enxergar, de se assumir, de se aceitar livre de grilos, exatamente do jeito que está, de não negar a fraqueza, e de perceber nela uma oportunidade para a manifestação do poder de Deus. A graça que bastou pra Paulo, basta pra mim. O grito reformado de "Sola gratia", é o meu grito também. Os vasos de barro que guardam os tesouros do reino serão sempre de barro “para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós”. Porque agora eu sei que quanto mais santo mais humano, quanto mais humano mais santo. A graça de ser fraco. A força de ser gente em Cristo.

“Amazing Grace” é uma bela e antiga canção conhecida no mundo todo. Seu compositor foi John Newton, um traficante de escravos que ofereceu sua vida à Cristo em meio a tempestade e naufrágio de seu navio. Pecador, fraco, à beira da morte, ele confiou na graça, ele descobriu a glória da fraqueza. Certa vez, ele disse: “Eu não sou o que poderia ser, eu não sou o que deveria ser, eu não sou o que gostaria de ser, eu não sou o que pretendo ser, mas agradeço a Deus, que não sou o que uma vez já fui, e posso dizer com a graça de Deus, eu sou o que sou”. Sem saber, falei algo bem parecido no começo. Mas sabe aquela história de identificação e aprendizado? Pecadores graciosamente salvos sempre se identificam.

A Ele a glória!

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Vulneráveis

Por Eliel Moura

Eu estava em frente à TV quando a fatídica notícia veio à tona. MacGyver era o protagonista de uma série de ação (Profissão: perigo) transmitida em meados da década de 1980 e 90. Eram fascinantes suas peripécias e na minha mente de criança ele era o melhor que nós tínhamos: um herói que sempre dava um jeito de escapar e vencer, não tendo quase nada em mãos! Nós o conhecíamos pelo nome abrasileirado de Magaiver! Neste dia, como usualmente, estava assistindo a mais uma de suas ousadas aventuras. De repente, escutei o comentário, demasiado confuso pra mim. “Como assim a voz do Magaiver não é a voz do Magaiver?”, eu indaguei. Minha mãe, numa explicação difícil de ser recebida usou o termo dublagem para avançar no esclarecimento. A situação agravou-se ainda mais quando ela concluiu dizendo: “Magaiver fala inglês e não português”. Só fiquei realmente convencido depois da dica, para que eu reparasse atentamente na fala do personagem. Foi duro constatar que às vezes ele mexia a boca depois de já ter falado tudo, e que, outras tantas, ele incrivelmente falava com a boca já fechada!

É claro que meu mundo não caiu e nem precisei de seções de análise para me recuperar! Crianças descobrindo o mundo não têm tempo pra isso e eu já tinha sobrevivido à descoberta alarmante de que quando andava no carro do meu pai, a lua não estava nos seguindo! O que mudou naquele dia foi que, no momento em que Magaiver “perdeu a voz”, ele deixou de ser intocável, saiu do roll dos super-heróis e da fantasia. Já não era mais alguém extraordinariamente indestrutível, até manipulavam sua verdadeira voz! Depois da decepção, continuei não perdendo nenhum de seus episódios, que ainda eram singulares!

O tempo passou e observo até hoje a desconstrução de mitos, a queda de heróis, a fraqueza de gigantes... É algo recorrente, assim como o nascer e o pôr do sol. Seja no oriente, seja no ocidente, há sempre um poderoso homem revelando-se pequenino. Desde sanguinários ditadores até presidentes, chefes de Estado e estrelas de cinema: temos exemplos, em todas as áreas, de pessoas aclamadas como inatingíveis e que declinaram. O que mais me chama a atenção não é a constância destes eventos: surpreendo-me com o fato de ainda ficarmos surpresos! Digo isto porque, a experiência deveria nos ter ensinado que não é razoável colocar homens num lugar onde só Deus pode, satisfatoriamente, estar.

Palavras como frustração e desgosto são primárias quando descobrimos a humanidade em pessoas antes vistas como inabaláveis. Na mesma velocidade com que construímos a redoma ascética que as separavam do restante dos mortais, canalizamos nossa revolta na construção de buracos, destinados ao funeral, quando das suas falhas. Tão logo finda a cerimônia de sepultamento, nosso imaginário esta pronto para eleger o próximo “santo” numa voracidade assustadora. Este indivíduo - a bola da vez - sofrerá bastante. Será puxado de um lado para o outro, fará milagres e mais milagres, alimentará multidões, mas insistentemente elas voltarão famintas, ávidas por mais milagres, mais comida, mas respostas, mas consolo... Não conheço nenhum destes “santos” que não tenha sucumbido de uma maneira ou de outra.

Sucumbir pode ser maravilhoso! Como um grito da alma dizendo: pare com isto, eu sou vulnerável! Para os cristãos é a confissão de que, o lugar que é de Jesus continua separado e que cabe a nós somente compartilhar do seu cálice, não bebê-lo todo! É também a destruição dos postes-ídolos que levam nossa própria imagem e que nos ovacionam como deuses. Sucumbir neste caso não é cair em pecado para que todos vejam o quanto somos falhos, pelo contrário, é não pecar deixando bem claro nossas fraquezas e fragilidades. Na renúncia ao triunfalismo que constrói personagens cristãs que dão muita audiência, vem à tona a verdade: não passamos de “um sono, como a relva que floresce de madrugada; de madrugada viceja e floresce, à tarde murcha e seca” (Sl 90:5 e 6). Felizes os que vencem as massas beatificantes com as marcas da vulnerabilidade, estão desta forma, protegidos de tão grande queda! Felizes também os que não constroem para si ídolos humanos, e os que rejeitam uma espiritualidade separada da premissa de que somos todos pecadores. Ser um referencial nas escrituras nunca foi o sustentar de um título de infalibilidade ou o ter uma austera capa de supra- humanidade. Lembramos, pelo contrário, de homens quebrantados e contritos que caminhavam com Deus.

Sucumbir pode ter um lado trágico também. Isto se dá quando realmente acreditamos nas vozes da multidão e no seu imaginário tecido a nosso respeito. É quando realmente achamos que somos intocáveis e que chegamos a um lugar inatingível. A mentira vira verdade e o sofisma cauteriza a mente. Um caso exemplar nas escrituras esta em Êxodo, lá vemos Faraó sendo vencido por Moises e seu Deus. Destaca-se o fato de que Faraó, naquela sociedade, era considerado um deus, a própria personificação da divindade egípcia Rá. Um dia ele teve que abrir os olhos à realidade, ele não era soberano e o Deus verdadeiro o estava esmigalhando diante de todos os seus súditos, o humilhando na sua soberba. Neste segundo modo de queda, não reconhecemos nosso papel de coadjuvantes e pensamos poder ser Deus, ou pelo menos imaginamos poder fingir ser um. Depois de criada a máscara de perfeição, há um alto custo para mantê-la de pé e todos que tentam este caminho começam a definhar por dentro antes mesmo que os sinais exteriores enfim venham à tona. Deus não divide sua glória com ninguém e sucumbimos por bem ou por mal.

Estou cada vez mais apaixonado por pessoas vulneráveis, que abandonaram as máscaras da falsa espiritualidade e que se mostram como realmente são. Deixaram de lado os pudores da religião e abraçaram a vida de Jesus, entendendo quem é Ele e quem somos nós. A vulnerabilidade, além de revelar a sujeira escondida, abre o coração para sentirmos a brisa suave, que trás consigo, um leve aroma de redenção! Vence os calos espirituais e prepara-nos para sermos tocados de novo! Ainda mais, nivela todos os homens e protege o coração de exercer julgamentos, que pertencem somente a Deus. Os vulneráveis ficam doentes, todavia, são os únicos que podem ser curados!

Saudações aos fracos e pecadores que estão com Jesus, dos quais certamente, figuro entre os primeiros!

domingo, 7 de setembro de 2008

Emanuel

Por Robson Wellington

Estou contaminado pela presumida familiaridade, desconhecimento, desdém, ignorância e irrelevância prática de Jesus, Sua mensagem e Sua vida como realidade e instrumento vital para o dia-a-dia. Declarei independência da origem, perdi os relacionamentos, subverti a estrutura e a ordem, reverti os papéis, caí.

Mesmo assim Ele veio. Emanuel. Um grande nevoeiro paira sobre o fato de que Ele veio à terra não exclusivamente para seu sacrifício na cruz. A promessa foi: "Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho e lhe chamará Emanuel". O nome Emanuel significa "Deus conosco" (Mateus 1:23) e isso implica mais do que uma breve visita para um ato sacrificial; revela também o compartilhar da experiência humana. Assim como os que projetam móveis de montar freqüentemente acrescentam desenhos às suas instruções, assim também Deus planejou desde o início dos tempos dar aos homens não só instruções, mas o modelo perfeito do Seu próprio Filho, a quem o homem foi criado para copiar.

Minha ignorância, rebeldia e independência é evidenciada pela ausência dEle em meus estudos, trabalhos, divertimentos, palavras, pensamentos, ações, atitudes, relacionamentos. A idéia básica do discipulado era amplamente aceita quando Jesus começou seu ministério, mas Ele criou um padrão revolucionário. Ele tomou a iniciativa de convidar pessoas para segui-lo, chamando-as primeiramente a si próprio e não apenas ao seu ensino; esperou delas total obediência, quando as ensinou a servir e as advertiu que iriam sofrer; e reuniu ao seu redor um grupo diverso de pessoas comuns.

Será que realmente sou seu discípulo? Tenho tentando remar contra a maré do ritualismo estéril, especulação teológica e irrelevância prática passando mais tempo nos evangelhos estudando a vida de Cristo, mas vejo que sou bom para teorizar e letárgico para praticar, me preocupo com o supérfluo e desprezo o fundamental. Será que sei viver sem ser materialista, orgulhoso e egocêntrico, avançando em direção à vida que se assemelha à de Cristo? Sinto-me às vezes, crente numa espécie de ET, mágico ou sofista.

O Emanuel veio servir de modelo da criação de Deus e anunciar o reino de Deus que é chegado, que está próximo, que está entre nós. Quanto mais o conhecemos de verdade e o imitamos, mais as nossas reações aos desafios da vida serão reações dele e não da carne. Então poderemos dizer com Paulo: "Já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim" (Gálatas 2:20). Será que realmente desejo seguir o Emanuel?

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Prelúdio: sede e fome.

Por Eliel Moura

Todos se dão conta em algum momento. E isto é a benção maior, a única que não perseguimos. A dádiva de descobrir que Ele ficou pelo caminho. A inegável percepção a cerca dos rumores e ecos do passado, tão fortes e reais que solidificam por tanto tempo à alegoria de Sua presença. Mas já não bate vento.

Seus resquícios algemam a alma e nenhum entorpecente zela a obscuridade sem ao menos dar sinal de que algo esta errado. Quando da mais casual desventura, o ressoar da verdade revela as lacunas sutilmente preenchidas com nada. O nada parece ser tudo: tudo que precisamos para viver, o que mais ambicionamos - nossos anseios revestidos de legitimidade. O tudo não chega a ser nada, continua muito importante, é o passaporte para a felicidade. Os olhares que O fitam ultrapassam Sua pessoa, vasculhando o que a terra prometida pode oferecer. Das tolices que disse, acertou o barbudo ao dizer que isto é Ópio. Antes o vício estivesse Nele, mas não é assim, dependemos da estrutura que O descreve, ou daquilo que através Dele se vislumbra experimentar. Mas aqui esta a Graça, prestes a denunciar a aridez escondia em miragens de Oásis. Os desertos foram mares, não há como ignorar esta idéia, nem tampouco esconder o que tal ambiente evoca: é sede o que sentimos.

Na mente até a razão concorda em buscá-Lo e Lhe devolver Sua poltrona – já que a sala e sua TV tem sido o lugar central das famílias modernas. Da mesma forma, há unanimidade a respeito de tê-Lo de novo, do modo impetuoso como já fora recebido. Porém, onde reencontrá-Lo? Pergunta feliz de ser feita, mas sua composição pesa sobremodo. Nesta altura a trama tende a trazer a agência e a ação ao desertor, como se soluções se originassem nele. Mas afinal, não seria a própria consciência da escassez fruto da intervenção Dele? O absoluto permanece onde esteve, é imutável... E o movimento que nos leva de volta conspira de infindáveis maneiras. Epifania! Subitamente a idéia: e se talvez vasculhássemos os restos de comida? Fria, sem sabor. As migalhas formam a trilha para a farta mesa onde Ele é o próprio banquete. Uma dimensão plenamente satisfatória, não mais um caminho por onde se passa para chegar a algum lugar, mas o ponto final. Estamos famintos.

Deserto sem brisa com comida estragada! Não é o inferno. Quem sabe a porta pro céu, o caminho de volta a Ele...