sábado, 21 de fevereiro de 2009

De outros carnavais

Por Robson Wellington

Durante minha infância, meu avô costumava passar o Carnaval conosco. Lembro que ele conseguia ver todo o desfile. O seu sambar era um tímido balançar de pés sentado enquanto acompanhava a transmissão. Ele compartilhou comigo o segredo para ficar acordado por toda madrugada. A cada intervalo ele lavava o rosto. Eu nunca conseguia. Na manhã seguinte ele contava tudo o que tinha acontecido. O mais belo desfile. O carro que quebrou. A escola que perdeu ponto. Herdei dele a torcida pela Portela. Adorava o tradicional cachorro-quente e o samba-enredo tocando bem alto durante todo o dia lá em casa. Como corria de medo do bate-bola na rua! Ah, guardo boas lembranças desses carnavais!

As origens do Carnaval têm sido buscadas nas mais antigas celebrações da humanidade. O ponto de concordância é que eram festas associadas a fenômenos astronômicos e a ciclos naturais. Festa para comemorar a renovação da natureza e espantar os demônios da má colheita. Com o tempo foram inseridos novos elementos como bebidas e sexo. Os cristãos taxaram o Carnaval como festa profana. Na Idade Média, porém, ela foi cristianizada, passando a fazer parte do calendário religioso. Dias gordos onde “carne vale” antecedendo os quarenta dias sem comer carne da Quaresma. A partir do Renascimento, as festas voltaram a incorporar outros elementos e foi se firmando um caráter mais popular. Cada cidade brincava de um jeito, de acordo com seus costumes.

Não tem como negar que o Carnaval é uma forte manifestação da cultura brasileira. Também não tem como negar que os evangélicos em geral tem grande dificuldade de se relacionar com a cultura que os cerca de forma pacífica. Reside nos corações um grande medo de perder a fé ou ser atacado pelo inimigo que sorrateiramente nos espreita atrás de cada manifestação cultural. Já participei de retiros espirituais. Já participei de impactos evangelísticos. E até vivi boas experiências. Respeito profundamente a sinceridade nas motivações de quem participa de uma coisa ou de outra nesses extremos de posicionamento diante dessa festividade. Mas não consigo mais. O sectarismo cultural dos retiros e o imperialismo cultural dos impactos não encontram mais eco em mim.

Algumas pessoas resistem ao Evangelho, não porque o achem falso, mas porque vêem nele uma ameaça à sua cultura, especialmente quanto à estrutura de sua sociedade e identidade grupal. Jesus realmente é um perturbador da ordem. Mas ele também é um pacifista. Há em cada cultura aspectos que não são incompatíveis com o senhorio de Cristo, e que, portanto não precisam ser ameaçadas ou descartadas, mas, antes preservadas e transformadas. Isso requer uma profunda compreensão e apreciação cultural. Infelizmente, preferimos “fechar o corpo” entre as quatro paredes geladas de nossos templos ou sítios ou entrar em guerra espiritual bombardeando uma mensagem alienígena. O resultado é que muito ressentimento é suscitado. A mensagem não é vista como evangelismo, mas sim condenação e imposição de costumes.

Vale lembrar que “é outro o Carnaval que tanto anseio. Não o de salões abarrotados de gritos desconexos nem o de desfiles que disfarçam de luxo a indigência do povo. Quero a alegria d'alma, arlequim bailando em meu espírito, o odor suave da colombina afagando os meus cabelos. Quero a serpentina enlaçando fraternuras e confetes salpicando de estrelas os telhados de meus sonhos. Quero o Rei Momo premiando o meu país de farturas e o corso da alegria atravessando as ruas dos meus passos”. Sonho com o cumprimento da visão da unção maravilhosa da música “Brasileirinho” pelo Espírito de Deus e de centenas de pastores dançando ao som do chorinho. Deixando bem claro que tudo que é belo e bom provêm do Deus que é Senhor sobre toda atividade cultural humana, inclusive o Carnaval.

18 comentários:

Unknown disse...

Faz muito sentido...muito...

Caleb disse...

É eu tb penso um pouco assim.
O único problema é que a Igreja Catolica cristianizou o carnaval de maneira errada, como:
Um dia onde meus pecados não são contados e eu me divertirei com a carne.
Onde deveria ser um dia onde eu me divertiria com Deus e com a liberdade que ele me da, o que vemos que é bem possível em nossas festas. Seria um carnaval sem quarta-feira de cinzas, pois não fizemos nada errada apenas celebramos a nossa liberdade do pecado graças a Deus.
Então eu por causa deste sentido maior dado, infelizmente, pela própria igreja ao carnaval não sei se seria sábio apoiar a cultura como ela o é...

Diego disse...

Descordo em parte, enquanto realmente é sofrivel os cristãos se esconderem em retiros durante essa época, a mensagem tem que ser pregada de maneira sincera e é obvio para mim que a mensagem do amor de Jesus e o estilo de vida dEle encontra oposição em praticamente tudo que acontece nessa época, acho que nesse sentido sim a mensagem é alienigena, porque é uma mensagem que não se conforma com esse mundo. Gritos inconformados com tantas mortes, traições e atropelamentos da nossa festa cultural.

Miguel Del Castillo disse...

assino embaixo.

Anônimo disse...

Só não gostei de uma coisa...
A mensagem de Deus não é uma mensagem alienígena, mas aquilo que se pregam/"falam" no carnaval, de que tudo é festa, folia e empolgação no sentido mais ruim, este sim é uma mensagem muito além de outro mundo, pois isto faz cegar os humanos que participam desta festa daquilo que realmente acontece em suas vidas finitas.
Enquanto a festa rola, muitos (a maioria esmagadora) não sabem o que de fato está acontecendo, o que para a infelicidade de cada um é a sua ida para a morte eterna.
Por isso, não concondo em dizer que a mensagem de Deus, a Palavra dEle, a Biblia seja considerada uma coisa extraterrestre, pois são As Palavras dEle que nos tras aquilo que realmente de Fato está acontecendo em nossas vidas.
A nossa realidade sempre deverá se basear em Deus e não naquilo que a gente acha que é e o que não é real.
Infelizmente, a humanidade usou e usa sua inteligência, seu raciocíno e suas emoções para deturpar tudo aquilo que realmente Deus nos deu.
O Carnaval poderia ser verdadeiramente de Deus, mas a população utiliza para os prazeres da carne, por isso, não quer ver Deus presente em suas festividades.

Marlon Ribeiro disse...

Bom..primeira é bem lembrado que o carnaval n é puramente Brasileiro, apenas temos nossa maneira de o realizar. mudada com o tempo, e necessário dizer, mudanças malipuladas pela midia. em New Orleans tem carnaval, ao som do dixieland desde o inicio do seculo XX. e outras manifestações anteriores a essas. quero com isso mostrar que o carnaval n é Brasil. n é cultura nossa! apenas temos um geito diferente de o fazer, por diversos fatores. isso me faz pensar que a questão n é o q se faz, mas como o faz e o pq faz. isso vale tanto para ir no sambodramo para sambar tanto quanto para evngelizar. e se quiser se retirar. tomem cuidados com os mosquitos!!!

Filipe Degani disse...

Concordo. Acho que o Carnaval mereça ser cristianizado, evitando é claro, uma "gospelização"...se não, fica bizarrice total!
Falo de cristianização, pensando em uma verdadeira mudança da essência da festa, uma celebração verdadeira ao que merece ser celebrado: Deus e suas dádivas.
A própria idéia do nosso carnaval de contar uma história por meio de fantasias e alegorias também é fantástica. Pode ser muito bem usada para uma evangelização "sem imperialismo".
Mas...seria muito engraçado ver alguns pastores q eu conheço dançadno Brasileirinho...uhahaahh

Robson Wellington disse...

Olá queridos!

Gostaria de fazer alguns esclarecimentos acerca do meu post:

1) Não considero sofrível o fato de cristãos passarem o carnaval em retiros, como também não considero sofrível os impactos. Não vejo problema nos retiros ou nos impactos em si. O problema é o sectarismo e imperialismo cultural que em geral regem esses eventos.

2) Não considero os impactos superiores aos retiros. Bombardear uma mensagem alienígena é tão nocivo quanto fechar o corpo em sítios.

3) Não estou fazendo apologia aos excessos da nossa sociedade que ficam mais evidentes nas celebrações do carnaval. Elogio é a compreensão cultural que gere preservação do que é bom e transformação do que é ruim.

4) Nenhuma testemunha cristã pode ter esperança de comunicar o evangelho de forma eficaz ignorando o fator cultural. A mensagem de Jesus é a Boa Notícia que embora não seja deste mundo é para este mundo.

Obrigado pelos comentários!
Deus agracie!

Robson Wellington

Gil disse...

Entendo sua perspectiva, mais por causa de conversas do que por causa desse post. Na verdade, acho que vc exagerou em muitas coisas. De fato não dá pra demonizar a cultura, mas tampouco dá pra neutralizar o que há de demoníaco na mesma. E desculpem os "liberais" de plantão, mas há muito mais de demoníaco no carnaval do que expressão cultural. As letras dos samba-enredos são apenas uma pequena amostra.
Vlw, Robson, posso até ser culturalmente liberal, mas ainda sou teologicamente conservador!
Abraços!

Robson Wellington disse...

Ah Gil, esse lance de teologicamente conservador e culturalmente liberal era como eu tentava me definir! Mas, entendo você.

Abraço!

Robson Wellington

Gil disse...

Bom, não é propriamente uma autodefinição, mas uma perspectiva. Na falta de algo mais consistente, fico com a ortodoxia... ou já era tudo. E não me darei era opção.
Abraços!

Robson Wellington disse...

Gil, apesar de discordar da sua colocação de que "há muito mais de demoníaco no carnaval do que expressão cultural. As letras dos samba-enredos são apenas uma pequena amostra". Faço coro com o conceito chestertoniano de ortodoxia hein... Isso pode ser uma luz no fim do túnel, neh? hehehe

Abraço!

Robson Wellington

Tiago Puglia † disse...

certissimo doutor robson... certissimo...

Marlon Ribeiro disse...

ta certo..concordo com o Gil sobre o emcapetamento de outras cosias, e Robson sabe como gosto do Chesterton e da ortodixia...mas o carnaval ja passou!!!kkk

marlonismo.blogspot.com

Robson Wellington disse...

Marlon,

O carnaval acabou mais a polêmica do carnaval foi parar em outro blog. Pra quem quiser acompanhar aqui vai o link:

http://mastigue.com/2009/02/19/a-feiura-da-beleza/

Robson Wellington

Anônimo disse...

CARNAVAL = FESTA DA CARNE

o diabo quer que façamos isso que consta em muitos posts, aceitar o carnaval como algo "bonito" e cristianizar o mesmo, ou seja mascarar essa festa como vem sendo feito com muitas outras, como a festa junina, homenagem à são joão e a maioria celebra essa festa "mascarando" o sentido achando que esta tudo perfeito e aceitável por Deus!

Clarissa disse...

Que bonitinho, o Robson de 2009! Por que parou de escrever?

Renato disse...

Deixo um trecho incoerente que faz parte da estrutura geral do pensamento do texto: "Jesus realmente é um perturbador da ordem. Mas ele também é um pacifista." Jesus nunca foi membro de nenhum partido para desarmamento (cuidado com o português) e nunca foi pacificador, como alguém pode perturbar a ordem sendo pacifista? Incoerente. Em MT 4 dos versículos 12 em diante nos mostra que o início da pregação de Jesus era arrpendam-se! Convide alguém que acha que está correto a se arrepender e veja no que vai dar isso. O autor do texto pensa estar correto, assim como eu penso estar correto porém há uma leve diferença em me apoiar na Palavra de Deus, usar um trecho completo e com todo o sentido literal do texto sem acréscimos ou interpretações e usar as minhas próprias convicções ou experiências de vida para dizer como devemos proceder quanto á uma festa com todos esses adereços. A bíblia nos diz que se meu olho me faz pecar é melhor arrancá-lo, logo, temos base para extirpar uma festa que carrega um lastro de pecado e imoralidade do nosso meio sem qualquer dificuldade. Cultura é uma coisa, imoralidade é outra. Se partirmos desse pressuposto vamos voltar ao culto á Baal e Astarote pois era uma cultura não é mesmo? Pense a respeito. Ninguém é dono da razão mas Deus é.